As fronteiras mundo afora podem estar mudando constantemente, mas nossa vontade de buscar experiências transformadoras só cresce. E é por isso que iniciamos hoje a série Viajando com, em que nosso time conta suas mais incríveis aventuras e segredos descobertos em andanças nada óbvias.
Para começar, ninguém melhor do que Susanna Lemann, nossa fundadora, viajante curiosa há longa data e apaixonada pela natureza. Dos hikings pelo Tibet aos castelos da França, passando pelos vilarejos da Etiópia, ela está sempre em busca de jornadas raras para o nosso portfólio. A seguir, Susanna divide conosco seu diário de viagem recheado de boas memórias. Afinal, nada melhor do que histórias reais para inspirar nossos planos futuros.
1.Se pudesse viajar para qualquer lugar amanhã, qual seria sua escolha?
Eu voltaria para o Butão e o Nepal… Adoro caminhar e estou com saudades destas trilhas envoltas pelo ar puro das montanhas do Himalaia, das tradições místicas, do yoga e das pessoas simples e felizes que vivem por lá. Parece fugir da realidade, né? A verdade é que eu tenho o sonho de viver em um lugar de florestas verdes, povos com tradições ricas e uma governança pragmática, sem Covid, briga ou violência. O Brasil poderia ser este lugar!
2.Qual a memória de viagem que mais aquece o seu coração?
Minha lua de mel foi na França, andando de bicicleta pelo Vale do Loire, dormindo uma noite em cada castelo. Uma viagem encantadora em todos os sentidos: pelas histórias fascinantes de reis e rainhas, conquistas e perdas; pelos campos verdes da região; suas cidadezinhas históricas; as coloridas feiras ao ar livre e as “baguettes” com queijos deliciosos que encontramos pelo caminho. Aprendi a apreciar vinho tinto e hoje me gabo de entender do assunto e da culinária mediterrânea. E o melhor foi que, por conta do nosso status de recém-casados, éramos convidados a ocupar a suíte principal dos castelos. Por isso posso dizer que sou uma princesa real!
3.Conte pra gente seu segredo, aquele cantinho no mundo que só você conhece.
Já ouviram falar do “Tea Horse Trail”? É uma rota comercial perigosa, por montanhas íngremes entre a China e o Tibet. Trata-se de um trecho mais frequentado no século XIII, quando a China trocava seus chás pelos cavalos tibetanos. Era louca para conhecer e abracei o desafio de organizar uma viagem de aventura – que não abria mão do conforto – para um grupo de dez amigas. Começamos nos adaptando à altitude em Shangri-La. Caminhamos em florestas de flores rhododendrons gigantes, atravessamos rios – alguns bastante bravos – e seguimos trilhas estreitas entre vilarejos pequenos no alto de vales intermináveis. Foi uma bela jornada, repleta de piqueniques inesquecíveis e surpresas carinhosas. Dormimos em “family lodges”, que surpreenderam pela hospitalidade e qualidade. Achamos monastérios escondidos, assistimos debates dos monges, ajudamos a imprimir as rezas e cantamos. Comemos muito pão de cevada e iogurte de yak, entre tantas outras experiências inesquecíveis. Ficou a incrível sensação de sermos desbravadoras de um canto inusitado e ainda muito pouco explorado neste mundo.
4. Todo mundo tem uma história curiosa de viagem. Conte pra gente as suas mais marcantes.
Aconteceram muitas coisas curiosas, principalmente quando viajava com menos recursos. Nos roteiros de ônibus pelas Américas Central e Latina, por exemplo, lembro particularmente das galinhas e dos porquinhos que nos acompanhavam o tempo todo no teto do ônibus ou da garota que insistia em deixar seu bebê comigo na beira do lago Titicaca. Com o privilégio de poder viajar com mais estrutura, as histórias mudam. Hoje adoro uma aventura, mas tem duas coisas que considero essenciais: dormir em uma cama boa e caminhar sem peso nas costas. Mais recentemente, eu e duas amigas entregamos nossos pertences para percorrer uma caminhada em Myanmar, com o objetivo de chegar em um monastério à noite. Andamos o dia todo por paisagens lindíssimas e, quando alcançamos o vilarejo montanhoso no final da tarde, percebemos que não havia como um carro – ou nossas mochilas – acessarem o local. Para completar, o monastério não tinha água, nem cama. Dormimos no chão, mas protegidas por uma estátua de buda.
Foi contra todos os princípios da Matueté, que, aliás, não organizou esta parte, mas sobrevivemos e hoje nos divertimos com o episódio. Lembro com carinho também do convite que recebi de surpresa para o casamento de um príncipe indiano em Udaipur, no exato momento em que caminhava com minhas amigas pelo norte da Índia. Foi uma das experiências mais ricas e alegres na minha vida! Ou do burro que nos seguiu inesperadamente pela trilha do Caminho de Abrão, incrementando nossas fotografias bíblicas e até salvando uma participante que torceu o pé.
5. A refeição mais memorável que já aconteceu em uma viagem.
No final do nosso trekking pelas Dolomitas, chegamos super cansadas no Hotel Rosa Alpina. Cansados demais para jantar? Nem pensar!
O chef do restaurante St. Hubertus, três estrelas Michelin, nos surpreendeu com um banquete de gastronomia local e sustentável em uma inesquecível aventura sensorial.
6. Um quarto de hotel que te faz sonhar acordada …
Amo a natureza e sou muito ativa, então meu quarto de hotel não precisa ser muito luxuoso, mas confortável e com uma vista incrível.
Nada melhor do que sentar em uma varanda com vista para o Delta do Okavango e admirar seus pântanos de tirar o fôlego, com uma vida selvagem intensa, apreciando o som deste universo intacto. Também sou uma mergulhadora apaixonada, preocupada com a proteção dos oceanos. Depois de nadar com mantas ou tubarões baleia nas águas cristalinas das Maldivas, amo descansar em um bangalô sobre a água. No Tahiti, faço o mesmo e ainda aproveito os tratamentos maravilhosos do spa.
7. Qual o maior choque cultural que já viveu?
Foi na Etiópia, especialmente no sul, onde visitei povos indígenas muito, muito simples, na beira do rio Omo, que raramente têm contato com a civilização. Me impressionei com suas decorações corporais – tatuagens, piercings, pratos labiais – e com os rituais tradicionais.
Experiências como essa me fazem refletir sobre a importância de um turismo harmonioso, que respeite a cultura e a história de cada lugar. Tive a mesma sensação quando viajei ao Xingu e pude assistir às demonstrações de kuarup e huka-huka com meus filhos. Um tremendo espetáculo, mas um choque cultural, em que tento achar uma justificativa para nossa invasão a este espaço sagrado, pela incompatibilidade entre tradição e a modernização.
8. Tirando a sua própria casa, qual o seu lugar no mundo, aquela cidade, vila, rua que te faz sentir abraçada?
Eu sempre falo que poderia morar em qualquer lugar no mundo. Amo cidades grandes por sua dinâmica, além de ofertas culinárias
e culturais. Poderia falar de São Paulo, Singapura, Paris, New York… Mas a que mais sinto saudades é Los Angeles. Meu filho estudou lá e me mostrou seu lado jovem, restaurantes veganos, exposições inusitadas, lojas inovadoras e seu estilo de vida relaxado no calçadão de Venice Beach. Fico no Shutters On The Beach, onde sou saudada pelo nome e recebo sugestões de novidades interessantes para explorar.
9.Temos só dois dias para conhecer Zurich, sua cidade: quais programas imperdíveis recomenda?
Se quiser fugir dos turistas da Bahnhofstrasse, coloque um sapato confortável e caminhe pelas ruelas estreitas e quintais românticos da cidade antiga, chamada de Niederdorf. Suba até o Lindenhof e aprecie a vista das igrejas, da universidade e das casas históricas na beira do rio Limmat. Entre na igreja Fraumünster para admirar os vidros coloridos do Chagall. Recomendo, inclusive, um tour guiado a pé, que desvenda alguns hábitos bem curiosos dos suíços. Se tiver meio dia livre, pegue um trem até Zürich-West, a parte recém reformada da cidade, com lojas e mercados de arquitetura e espírito jovem. Almoce no Hiltl, restaurante vegetariano mais requintado do mundo –experimente o tartar vegano! Reserve um peixe no Ristoranti Bianchi, ou uma “Bratwurst” (salsicha alemã) no famoso Zeughauskeller. Dois dias é pouco, mas não deixe de visitar o museu Kunsthaus ou assistir a uma performance da Ópera. Para se hospedar, se preferir a cidade antiga, recomendo o Boutique Hotel Marktgasse, ou o Storchen, que tem
vistas memoráveis.
10.O que te motiva a viajar?
Sou muito curiosa e gosto de aprender. Quando surge o interesse sobre um país, começo logo a pesquisar. Quando era estudante, todas as férias saía pela Europa pedindo carona. Com 24 anos, viajei pela primeira vez de mochila, com meu próprio dinheiro. Comecei pela Rússia, no trem transiberiano, e acabei no Brasil. Me apaixonei pelas belezas naturais e seu povo alegre e voltei para trabalhar aqui. Foi assim que passei a organizar férias para minha família e meus amigos e acabei ajudando a fundar a Matueté. Com a nossa produtora, minhas viagens ganharam qualidade, detalhes, surpresas, consciência e ainda mais carinho. Nunca viajo sozinha: gosto de compartilhar os momentos inusitados e que fortalecem as relações entre as pessoas.
Hoje organizo meus roteiros com dois objetivos: valorizar a união familiar e as amizades, ou buscar algo muito raro e precioso, que precisa ser protegido.
11. Qual o seu filme ou livro favorito sobre viagens?
O documentário A life on our planet, de David Attenborough, e o livro A short walk in the Hindu Kush, de Eric Newby, uma leitura gostosa e divertida sobre um explorador inglês que se aventurou nesta cordilheira no Afeganistão e Paquistão.
12. Quais as próximas viagens no seu radar?
Estou planejando descer o Nilo, no Egito, com toda a família a bordo de um veleiro, caminhar com amigas na costa Vicentina, em Portugal, e observar os ursos polares em Svalbard, na Noruega.